domingo, 11 de dezembro de 2011

igualdade num mundo de desiguais ?

Mais um post sobre um filme... Devo estar me achando A critica de cinema, né.


Esses dias assisti "Entre os Muros da Escola", que é uma espécie de quase-documentàrio sobre a situaçao da educaçao francesa. Acho que o filme pretende denunciar a situaçao de professores mais ou menos despreparados diante de alunos desrespeitosos - um problema bem conhecido no Brasil, e que começa a dar bastante pano pra manga aqui na França. O filme mostra os problemas de um professor tentando ensinar a uma turma com problemas de disciplina, de atençao e de inserçao. Essa questao da inserçao de deve ao fato de que muitos alunos sao filhos de imigrantes e os problemas escolares podem ser mais ou menos associados ao fato de os pais nao falarem francês, ou ao fato de os alunos nao se sentirem franceses. Mas o filme nao aponta o dedo pra nada, nao tenta dar explicaçoes globais (inclusive um dos meninos cujos pais nao falam francês é um bom aluno). Ele soh mostra o quotidiano e as relaçoes professor-alunos, professor-professor, e professor-pais de alunos, deixando as interpretaçoes por conta de quem assiste.
O problema, a meu ver, é que o filme tenta mostrar, de um lado, um professor coitadinho, tentando tratar os alunos como iguais, e de outro, alunos imaturos que usam isso contra o proprio professor.
Enfim. Eu jah trabalhei como disciplinària aqui, e vendo o filme eu fiquei chocada pela forma como o professor permite que os alunos falem com ele ; ademais, ele, professor, deixa alguns alunos trocarem insultos entre si na sala de aula... algo que eu, que soh era disciplinària, jamais permitiria (ou jamais permitiria sem que, ao menos, rolasse uma sançao). Sem falar nessa coisa de falar com os alunos de igual pra igual - o que deu precedentes aos alunos de falarem com o professor como se ELE fosse um colega, de forma muito desrespeitosa.

Mas aqui eu tenho que me explicar. Sendo disciplinària, eu me sentia mal com vàrias coisas : eu nao sei como explicar isso de uma forma que nao soe pretenciosa OU caricatural, mas estudando sociologia, de certa forma, a gente estuda (e tenta "denunciar") os mecanismos de poder, disciplina e obediência da sociedade.... Eu disse que ia soar caricatural.... Mas enfim, sendo disciplinària, EU era parte desse mecanismo ; eu era responsàvel por manter a escola enquanto instituiçao de disciplina e de vigilância. E eu era responsàvel por sancionar os alunos que nao se enquadrassem nessa regra. Claro que a aplicaçao quotidiana da regra é relativa (eu posso ser mais tolerante que outras disciplinàrias, ou fazer vista grossa, etc). Mas eu era obrigada, na grande maioria das vezes, a aplicar regras com as quais eu nao concordava.
Mesmo achando legal e saudàvel que os alunos questionem as coisas, eu
nao podia deixa-los ir muito além de um certo limite pq eu sabia que eles podiam se aproveitar disso. E se aproveitam, né, ô bicho idiota esse tal de adolescente. O que eu quero dizer é que eu considero que a escola é uma instituiçao que quer formatar pessoas a se enquadrarem em um certo perfil - do bom aluno, obediente, que nao questiona demais - e que isso pode ser extremamente opressor pra outros alunos. Mas na pràtica, eu nao podia dar espaço demais pra essas coisas : primeiro, pq eu "tinha" que fazer "meu trabaho", e segundo, pq uma açao igualitària numa estrutura desigual nao vai necessariamente libertar as pessoas, a nao ser que seja uma açao revolucionària.
Eh isso que eu quis dizer sobre a critica ao professor que "fala aos alunos como se eles fossem seus iguais". A escola DEVE adotar formas de relaçao professor-aluno mais igualitàrias, e que rompam com o esteriotipo do professor como "alguém ensinando ao aluno o que ele ainda nao sabe" (o que subentende que soh hà um caminho para saber as coisas - aquilo que o professor ensina -, e que soh importa o que ele ensina). A escola deveria, também, valorisar outros tipos de alunos, aqueles que fogem do padrao disciplinado (e que sao rapidamente rotulados de "incapazes", "desviantes"). Isso implica uma revoluçao na estrutura escolar. E ai sim, na minha opiniao, professores e alunos poderiam se tratar de forma igualitària.
O que o professor do fime fez foi reproduzir todo o esquema escolar (eu falo, eu ensino, EU é que tenho algo a ensinar, vcs sentam calados e aprendem) e introduzir um diàlogo falsamente igualitàrio, que na verdade era um estratégia (de prender a atençao dos alunos e de ganhar a confiança deles). E o resultado foi bastante desastroso.
Nao quero dizer com isso que professores devem falar com alunos como se estes fossem cachorros, mas existe um problema de coerência ai; ou vc aceita outras formas de saber e de comportamento, vindo dos alunos (o que é muito dificil dentro da estrutura escolar atual), ou vc estabelece uma distância proporcional àquela entre o seu saber e a falta de saber deles. Eu acho que misturar as duas coisas nao dà, por mais que a intençao do professor do filme possa ter sido boa. Eh muito fàcil - como foi o caso do filme - esbravejar contra os alunos, contra os problemas dessa geraçao que nao respeita mais ninguém e dos pobres professores desarmados diante disso... BEM mais dificil é apontar os muitos erros da estrutura escolar, que reproduz relaçoes de poder e de opressão.
Como disciplinària, eu sei que eu reproduzia esse sistema. Mas quando vc està na frente de 30 alunos e que vc tem que mante-los calados, é vc ou eles. Nao sei se posso chamar isso de "aprendizado", mas depois de um tempo vc cria o hàbito de nunca mais acreditar na palavra das pessoas (especialmente nos exemplares adolescentes destas) e de terminar discussoes com "cala a boca e fica quieto". Shame on me, I know.