domingo, 22 de janeiro de 2012

se o cara nasce mané, cresce mané


Tem um texto bombando por ai, sobre razoes pra ficar na Europa ou voltar pro Brasil. Nao vou linkar pq nao tenho razoes nem vontade pra isso, o texto me deixou puta. Eu sou muito (muito) dramàtica nas minhas reaçoes, do tipo discutir com o dedo em riste, e gente pau no cu é uma coisa que me deixa com sangue nos zoio.

(a pessoa escreve falando da Espanha, mas a coisa virou meio que um antagonismo generalizado Brasil x Europa, entao vou usar o genérico "Europa" aqui, pra nao ficar confuso)


Mas enfim, pq toda essa minha furia? Vamos tentar racionalizar todo esse odeo no coraçao.

Em primeiro lugar pq eu nao suporto gente que descreve a vida como se fosse um clipe de musica indie romântico. Graminha verde, gente cool and moderna, tudo muito lindo, tudo muito disney.


Tem a ver com o que a gente quer enxergar e - sobretudo, eu acho -, de como a gente quer que os outros vejam a nossa vida. E essa coisa Disney é meio hierarquizante, sabe? De uma certa forma quando vc elege um modo de vida como O modo perfeito, é como se todos os outros fossem inferiores. Isso vale pra quem enche a boca pra falar da Europa, como pra quem acha que o Brasil é perfeito. Assim como eu nao gosto de gente que acha que tà na Disney, tb nao gosto de gente que soh pensa em voltar pra Pasàrgada. Eu prefiro as nuances e os conflitos, ponto.

Ademais o tal texto cita muitas coisas que - confesso, apesar da ira - sao verdadeiras: a coisa de sair do proprio mundinho, de descobrir outras perspectivas, de se "desenraizar". Acontece que isso nao tem nada a ver com a Europa ou com o Brasil, tem a ver com o fato de experimentar novas coisas onde quer que vc và, e de onde quer que vc venha. O problema do texto citar essas coisas é que ela bota tudo isso na conta de coisas boas da Europa, e isso NAO é uma coisa boa da Europa. Sair da zona de conforto é uma coisa otima, mas vc pode ir pra qualquer lugar experimentar isso.

Mas enfim, tem também a questao do mundinho em questao. Como jah dizia o poeta, "se o cara nasce mané, cresce mané", e continua mané das zoropa ou anywhere else.

Vamos acompanhar como a pessoa descreve de que mundo ela vem:

Segundo ela, a Europa é tao legal pq ela aprendeu a respeitar diferenças.

Minha primeira reaçao foi, "Sério que ela diz que vem do mesmo pais que eu? Sério que a Europa é tolerante com as diferenças?"

To-le-ran-te com as di-fe-ren-ças?

Ok, falando um pouco mais sério. Eh tao OBVIO que ser tolerante com as diferenças é uma questao de ética pessoal, que vc aprende tentando ser uma pessoa melhor, que eu fiquei chocada de uma pessoa colocar isso num antagonismo Brasil x Europa. Se sua mae nao te deu educaçao, tenha olhar pro lado e entender o coleguinha. Nao precisa atravessar o atlântico.

Dai ela diz que aprendeu na Europa que é normal morar no mesmo prédio que o motorista de caminhao e comer no mesmo restaurante da faxineira.

Deu pra perceber essa coisa de mundinho? A pessoa acha que no Brasil a gente vive num sistema de castas e nao estava habituada a se misturar com o motorista ou a faxineira.

E ao invés de culpar o mundinho dela, ela culpa o Brasil. Tao mais simples. Fico me perguntando qual tipo de equaçao esquizofrênica a pessoa consegue fazer na cabeça pra botar violência, insegurança, nao me misturo com a faxineira, assim, num saco soh, como problemas do Brasil, e achar que o fato de ela nao ser beneficiada pelo sistema de saude na Europa - por ser estrangeira - é soh um detalhe que nao atrapalha a tolerância deles com a diferença. Pq a Europa jà tem graminha verde e velhinhos felizes gente, como é que eles iam ser malvados?

Enfim, nao vou comentar o texto todo pq pra isso eu ia ter que relê-lo. Lembro desses detalhes pq foram o que mais me chocaram e pq eu publiquei o texto no meu facebook pra poder xoxà-lo publicamente, e foram essas coisas que chocaram meus amigos tb. Pra mim gente que pensa assim sao tipicamente as mesmas pessoas que adoram dizer "o terceiro mundo nao me merece".

Eu nao tô defendendo o Brasil soh por defender, eu soh acho que isso nao sao motivos vàlidos - vou tentar fazer um texto sobre as minhas razoes pra ficar ou pra voltar, pode ser que algumas pessoas achem babaca tb, o que faz parte do direito inalienàvel de julgar-com-os-proprios-botões.

Cà com os meus botões, eu julgo pessoas assim com adjetivos tao severos - "babaca" sendo um dos mais bonitos - pq é simplesmente muito fàcil nao gostar da pobreza. Eh muito fàcil achar a Europa linda. Nao requer nenhum esforço de reflexão. Nao precisa quebrar a cabeça tentando mudar a propria realidade, ou ficar se perguntando pq as coisas sao assim, basta mudar pro lugar mais bonito. Là, a vida é disney.

Enfim, por ultimo, deixo uma bela pérola da autora do texto: "nem tudo sao flores, nao sou casada com um espanhol...".

Sem mais.

3 comentários:

Luana disse...

Eu so fui ficar sabendo desse texto por causa do blog da Simone, da Holanda... E eu estava agora mesmo pensando em escrever sobre isso tambem...

Eu concordo 100% com voce, eu tenho vergonha de ver a pessoa dizendo que precisou ir pra Espanha pra aprender a respeitar diferencas.. Isso vindo do BRASIL!!! Alias; eu acho o Beasil maravilhoso exatamene por termos tantas e tantas diferencas misturadas... Aqui na Zoropa nao, aqui ta tudo mundo se organizando em grupos, se dividindo... Vai ver diferencas pra ela foi ter amigos espanhois.. risos

Saber respeitar as diferencas eh algo sim que a gnete aprender de berco... Se a mamae dela nao ensinou eu so lamento... Alias, isso fica bem claso no comentario sobre morar no mesmo predio que uma faxineira... Nossa...

E nao ter casado com espanhol eh a cereja de pepino do bolo de passas ao rum...

S. W disse...

Martha adorei seu post, super pertinente. Eu não me dei ao trabalho de comentar a minha opniao naquele texto simplesmente porque OS argumentos sao tão xoxos, más tão xoxos que dá sono. Segundo Eu refletiria se a pessoa tivesse uma vida real, mas como Eu percebi nao tem, a questão das diferenças nunca foi tão grande pra mim quando voce falou, porque o que Eu mais vejo sao grupinhos e nacionalidades estigmatizadas. Como Eu contei que onde Eu trabalho nem olham currículos de indianos, preferem leste europeu pra oferecer salário menor... Enfim sempre respeitando as diferenças, mas a moça vive num comercial de margarina, nao temos como comparar. Beijos

marthacomth disse...

Obrigada pelos comentàrios, meninas. Pois é, "comercial de margarina" é bem o termo mesmo. Eu vi um povo que eu conheço publicando isso no fbook com legendas do tipo "falou tudo", "é como eu me sinto", etc, e por isso eu tive que vir xingar muito no twitter, rs.